Proençaes soen mui ben trobar
e dizen eles que é con amor;
mais os que troban no tempo da frol
e non en outro, sei eu ben que non
an tan gran coita no seu coraçon
qual m'eu por mha senhor vejo levar.
Pero que troban e saben loar
sas senhores o mais e o melhor
que eles poden, soõ sabedor
que os que troban quand'a frol sazon
á, e non ante, se Deus mi perdon,
non an tal coita qual eu ei sen par.
Ca os que troban e que s'alegrar
van eno tempo que ten a color
a frol consigu', e, tanto que se for
aquel tempo, logu'en trobar razon
non an, non viven en qual perdiçon
oj'eu vivo, que pois m'á-de matar.
D. Dinis
Cancioneiro da Vaticana, 127, e Cancioneiro da Biblioteca Nacional, 489
Os provençais que bem sabem trovar!
e dizem eles que trovam com amor,
mas os que só na estação da flor
vejo trovar jamais no coração
semelhante tristeza sentirão
qual por minha senhora ando a levar.
Muito bem trovam! Que bem sabem louvar
as suas bem-amadas! Com que ardor
os provençais lhes tecem um louvor!
Mas os que trovam durante a estação
da flor e nunca antes, sei que não
conhecem dor que à minha se compare.
Os que trovam e alegres vejo estar
quando na flor está derramada a cor
e que depois quando a estação se for,
de trovar não mais se lembrarão,
esses, sei eu que nunca morrerão
da desventura que vejo a mim matar.
Natália Correia
Cantares dos Trovadores Galego-Portugueses, editorial estampa, p. 251
Expoente da cultura portuguesa do século XX, personalidade única no meio português, mulher irreverente e impetuosa, furacão da política, celebradora do Amor, criadora de vasta obra de qualidade ímpar, cultora do Português clássico e erudito como poucos.
Estes cantares dos trovadores são a prova (se necessária fosse) da mestria com que dominou e assimilou na perfeição séculos de cultura portuguesa.
Da obra poética de Natália Correia destaco, apenas guiado pelo meu gosto, Sonetos Românticos (1990).
RIC
terça-feira, 17 de julho de 2007
I. Natália Correia dá-nos D. Dinis...
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12 comentários:
Como gosto eu desta mulher!...
Sou leitor assíduo da colectânea de poesia erótico-satírica.
Se fosse lá fora esta senhora tinha tudo para ser um ícone. Talvez mesmo um ícone gay. Aqui é uma figura pouco reconhecido pelos portugueses - que a associam mais à política e à 'trouvaille' do deputado João Morgado do que ao seu universo intelectual (não não vou dizer incontornável, rsrsrsr). E é pena. Natália Correia dá-nos D. Dinis e muito mais. Alguns - muito mais celebrados cá pelo burgo - apenas nos "dão música". ;)
Olá João M.!
Olha! E eu que me esqueci - apenas por instantes, note-se! - desse sector da obra!... Estou a ficar tansinho ou quê?! Rsrsrs!
Grandes palavras, João, escreveste tu agora aqui! E ainda maiores ideias nos ofereces nesta tardinha...
A propósito, hei-de lançar-me um dia destes em mais uma diatribe (à boa maneira de Juliano, o Apóstata)contra a cretinice prevalecente de que «intelectual», tanto o substantivo como o adjectivo, é negativo e pejorativo. Aliás, é mais uma herança do Estado Novo: havia que denegrir aqueles que pensavam pela sua própria cabeça e tinham as suas próprias ideias...
Tive um dia - fugaz instante! - a «subida honra» de lhe ter sido apresentado por uma amiga comum, no Botequim, e de com ela ter podido trocar meia dúzia de palavras que, por sorte, não foram de circunstância. Não imaginas (penso eu) o magnetismo intensíssimo que se desprendia da sua figura! E falava com a mesmíssima propriedade linguística com que escrevia! (Hoje temos ministros - espantalhos que nos dão «música» - que dizem em público «vênhamos»!!! Apre!!!)
Fazem-nos falta estas pessoas que abominavam carneiros em tropéis! Os tais portugueses de antes quebrar que torcer! Neste momento, dobram-se todos para dar o... por dinheiro e mais dinheiro...
A obra ensaística - que eu não conheço assim tão bem, infelizmente - é um manancial de cultura portuguesa! E curiosamente lembrei-me de outra senhora que também conheci pessoalmente e que já de seguida vou «investigar» para trazer para aqui também:
Maria de Lourdes Belchior!
Um abraço agradecido! :-)
As trovas de D. Dinis fazem-me lembrar um professor do secundário, lá pelas terras de Viriato.
Era tão comunista, tão comunista, tão comunista, que agora até é (ou foi) deputado do PSD LOL
De Natália Correia, lembro-me de Mátria.... chega
Somos um país de poetas, com os sentimentos na "ponta da pena"...
Abraço!
Eu não sei o porque, se tem uma forma de arte com a qual não me identifico é a literária rimada!
Não sei... rimas, trovas, poesias... nada disso me cala muito ao coração!
Beijão!
Olá Teddy Bear!
Não sei bem o que te diga, meu caro...
Em regra, as recordações do secundário são boas. Ou pelo menos as minhas são...
Quanto a esses bailes políticos, são apenas humanos... Afinal, tudo muda. Só não muda o carácter dos vira-casacas: esses sempre o foram!
Tu falas em Mátria, e eu lembro-me do «Mito Sebástico», designação que lhe é exclusiva.
Abraço! :-)
Olá Lampejo!
... Não estou assim tão certo de que isso corresponda exactamente à verdade... Parece-me mais um daqueles lugares-comuns do tipo «somos um país de doutores»: se de facto o fôssemos, não teríamos uma taxa de analfabetismo das mais elevadas da Europa...
Quanto a ti, não duvido um só instante de que tens alma de poeta! Ainda que não o assumas...
Abraço! :-)
Olá Ricardinho!
Pessoalmente, sempre li mais prosa ficcional do que poesia, mas há um grupinho de poetas que estão sempre comigo. São poucos, mas são decerto dos melhores!
Estou em crer que tudo depende, por um lado, do modo como a poesia nos foi apresentada e, por outro, de como a sentimos e também de como nos entregamos a ela...
Também é verdade que o mundo de hoje está cada vez mais «despoetizado»... Isto é uma perda e é grave!
Abração e beijão! :-)
Natália Correia, meu bom amigo Ric, é um oceano imenso de sensibilidade, força, feminismo e intelectualidade, entre tantas outras coisas.
Esta mulher admirável desdobrou-se em mil coisas, escreveu poemas lindos, textos importantes, peças de teatro geniais (não esqueço "A Pécora"), meteu mãos à obra para dar à luz um dos mais importantes livros da poesia portuguesa, a "Antologia da poesia erótico satírica" como bem referiu o João Manuel, foi uma parlamentar brilhante, esteve`muito à frente em termos da defesa da cay«usa GLBT (foi da sua iniciativa um ciclo de cinema do género, no saudoso Estúdio 444, que deu brado, na altura).
No Botequim era um regalo vê-la e ao seu grupo em noites memoráveis.
Será preciso mais?
A minha vénia a Natália Correia.
Abraço, Ric, e obrigado por nos recordares esta Senhora.
Olá João C.!
Não tens de quê! Ainda bem que há sempre quem faça o elogio destes seres de excepção! Eu não sou nada bom nesse tipo de encómios: quando acabo, apago porque acho sempre que está muito aquèm do que merecem... Assim, agradeço-te eu a ti por tão bem teres cantado Natália em síntese mestra!
Obrigado!
Abraço! :-)
Era miúdo mas ainda me lembro vagamente de a ver como deputada e tinha os programas na televisão. Só uns anitos depois é que comecei a tomar contacto com a obra dela.
Foi uma grande mulher.
Um abraço.
Olá Paulo!
Foi sem dúvida uma Grande Mulher e é um valor para sempre na cultura portuguesa. Um ser humano completo!
Eu adorava ouvi-la falar, quer na televisão, quer no parlamento, sobretudo quando se passava (com todo o respeito) e parecia querer levar tudo de enfiada e deitar a casa abaixo! Lembro-me de ela ter gritado, como se fosse outro Ipiranga: «Eu sou açoriana!»
Abraço! :-)
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